segunda-feira, 15 de agosto de 2016

A coesão territorial como resultado da economia social



Paulo Reis Mourão
(Professor do Departamento de Economia da Universidade do Minho)

Tendemos a ser influenciados pelo que nos rodeia. Mesmo que as nossas relações de vizinhança não sejam intensas, existe a comparação subconsciente do valor da nossa viatura, do recheio do nosso imóvel (dada a proximidade do valor do prédio) ou do sucesso dos nossos filhos com o que acontece nas casas vizinhas. É um comportamento humano e razoável (se não se tornar obsessivo).
A economia social tem o condão de nos fazer olhar ainda mais para os vizinhos. Em certa medida, mesmo os estranhos tornam-se próximos na economia que aproxima os agentes económicos, portanto, na economia social. Decerto inúmeras definições alternativas, classificações e taxonomias rodeiam este meu artigo relativamente ao senso de Economia Social, Terceiro Setor, Economia Solidária, Economia não Lucrativa, etc. Ensino-as e discuto-as, mas não aqui.
Aqui é o espaço de uma reflexão mais profunda e inovadora, sobre a capacidade de contágio que a economia social tem na vizinhança. Gostaria de ir mais além do mimetismo do bem, das ações solidárias e/ou caritativas, ou da espontaneidade de réplica que os espaços mediáticos, tão próximos quanto um iphone na palma da mão, conseguem aproximar.
Gostaria de discutir como as instituições da economia social, ao ficarem contagiadas pelas práticas das instituições sediadas nos espaços vizinhos, também elas são elementos promotores de Desenvolvimento Económico e Social.

Em primeiro lugar, as situações de foco da economia social são ‘common pools’, isto é, espaços abertos de necessidades que ultrapassam as fronteiras definidas pelas regras administrativas. Um sem-abrigo da Galiza pode acolher-se nas ruas do Porto. Um adolescente barrosão foragido de um ambiente disfuncional pernoita sob os céus de Braga. Um idoso do Alentejo portador de Alzheimer pode chegar a Santa Apolónia. Nestes três cenários de emergência social verificamos que não são fronteiras ou portagens que reduzem a mobilidade da emergência. Logo, o trabalho de resposta, como procura de solução, não fica limitado à origem nem ao destino. Em contrapartida, o trabalho de resposta só faz sentido em rede cooperante entre as instituições quer de destino, quer de sinalização, quer de acolhimento/institucionalização, quer de ressocialização.
Em segundo lugar, instituições vizinhas deparam-se com realidades muito próximas entre si. A bacia de desemprego no Vale do Ave é distinta do desemprego agrícola no Vale do Douro ou do desemprego terciarizado/graduado dos grandes centros do país. A economia social é sempre a primeira a perceber a emergência social e a primeira a desenhar respostas aos problemas sociais (só depois vem o Estado e o Setor Lucrativo de Intervenção Social). Portugal tem um exemplo histórico dessas respostas, na figura das Misericórdias e, ainda anterior, de muitas confrarias e mutualidades localizadas nas costas minhotas ainda antes de 1143. Instituições próximas percebem realidades emergentes das localidades – o envelhecimento isolado, a emigração dos jovens graduados, a escassez do apoio público após o push-up (quase o dictatum) original, a disfuncionalidade dos afetos, a dinâmica acelerada dos novos quadros valorativos.
Em terceiro lugar, também num impulso de criação de emprego qualificado (evitando a migração dos mais jovens e dos mais qualificados), as instituições organizam-se e emitem sinais entre si tendo em vista aproveitar a emergência de Programas de Legislatura de resposta circunstancial. Em 4 anos, o país quadruplicou o número de cantinas sociais que agora, em 4 anos, parece que serão reformadas/encerradas. As instituições, em mancha, contratualizaram refeições, esperaram apoios, desesperaram e desesperam com os custos incorridos e sabem que serão os primeiros a ouvir a reclamação dos utentes quando novos quadros de proteção social sobre a emergência alimentar forem alçados. Porque, convenhamos, as instituições da Economia Social são também, sempre, das primeiras a ouvir, sobretudo o grito dos que perderam a voz, o voto e o poder de compra.


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