quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Como se (re)parte um bolo






Como dividimos um bolo de aniversário? Geralmente, o distribuidor (que é quem parte) acerta com uma porção razoável para satisfazer a gulodice dos convivas e distribui porções muito parecidas pelos mesmos convidados, independentemente de serem homens ou mulheres, baixos ou altos, com mais ou menos massa corporal. Quando a divisão é mais intimista, por exemplo por duas pessoas, uma estratégia usada em Inglaterra é a de uma partir o ‘cake’ e a outra pessoa escolher a parte que mais lhe aprouver.
Já um Executivo político, ao distribuir fundos, raramente distribui a totalidade por igual. Na maioria dos esquemas distributivos de apoios, subvenções e investimentos pelos espaços governados no universo da OCDE, existe um mínimo que é comum a todos os espaços (cuja soma não ultrapassa os 25%) e depois cada espaço receberá em função de três dimensões: população, dinâmica económica e alavancagem política. A terceira dimensão (‘alavancagem política’) é a dimensão que funciona como uma espécie da antiga “lei do terço” testamentário, na qual o testador dispunha livremente do terço do património em questão para atribuir na sua discrição, independentemente dos amuos dos herdeiros legítimos.
Vai ser publicado, neste ano de 2016, na revista científica ‘Cuadernos de Economia’ a análise que fiz sobre “Descentralização e Desigualdade na distribuição dos fundos constitucionais brasileiros”.  As transferências constitucionais que, em sede de descentralização financeira, o governo de Brasília executa estão disponíveis, desde Janeiro de 1997 até ao período mais recente, na página electrónica do “Tesouro Nacional”. Estas transferências constitucionais (que representam, em média, 6% do PIB Brasileiro) são, principalmente, as seguintes: Fundo de Participação dos Estados - FPE, Fundo de Participação dos Municípios - FPM (art. 159 da Constituição Federal), Imposto Territorial Rural - ITR, Contribuição de Domínio Económico – CIDE, Imposto Sobre Operações Financeiras/Ouro - IOF-Ouro, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério - FUNDEF e o Fundo de Compensação pela Exportação de Produtos Industrializados – FPEX.
Observou-se, de um modo muito curioso (e portanto estimulador de Ciência) que quando a desigualdade na distribuição destes fundos cresce, o PIB brasileiro também cresce nos anos seguintes; ao invés, se a desigualdade na distribuição destes fundos diminui, o rendimento criado no Brasil tende também a diminuir. Este resultado foi ainda mais estimulante porque contrariou uma conclusão que eu previamente tinha feito para o caso Português, onde se verifica o inverso – se São Bento aumentar a desigualdade na repartição pelos municípios, o efeito gerado no futuro PIB português é negativo. Como conciliar, assim, estes resultados que envolvem países diferentes habitados por povos irmãos? A explicação encontra-se no diferencial do ciclo das taxas de crescimento económico. Países “rápidos” apostam mais nos cavalos corredores do que nos troteadores; países de crescimento mais lento apostam mais em quadrigas de modo a que todos cheguem ao mesmo tempo.
No entanto, convém não esquecer que o crescimento económico, como o rendimento de cada um, não é um fim em si mesmo. Será interessante também auscultar em que medida a distribuição desigual de fundos aumenta ou diminui a distribuição desigual de recursos qualificados, de desemprego/emprego, de assistência social e de perceção da qualidade de vida. Caso contrário, uns crescerão à custa do ananismo dos outros. Caso contrário, poderá haver bolo não comido nos pratos e azedume à volta da mesa.


Sem comentários:

Enviar um comentário