Num cenário de governo a prazo
(obviamente, todos os governos são a prazo, mas uns são-no mais do que outros),
a maioria dos cidadãos pergunta qual o reflexo desta gestão da contingência nas
suas vidas. Gostaria de incidir o meu comentário nos reflexos sobre as
dimensões que a Economia tem identificado como as mais sensíveis à expectativa
de instabilidade política: os investimentos, os projetos de transversalidade
temporal e o planeamento de transversalidade partidária.
Comecemos pelo Investimento.
Entende-se por Investimento toda a realização de despesa cuja utilidade é
diferida no tempo. Ao contrário da despesa em Consumo, que visa satisfazer
necessidades imediatas ou de curto prazo, o Investimento visa satisfazer
necessidades que se prolongam no tempo. Assim, é manifestação de investimento a
construção de uma casa, de uma fábrica, de colocação de depósitos a prazo ou um
empréstimo prestado a alguém. Desta forma, muitas vezes, o Investimento exige o
contributo de vários agentes que emprestam o resultado do seu trabalho para a
conclusão da obra. O Investimento, como envolve uma grande “fé” no futuro, é
uma dimensão que se realiza quando os agentes confiam que a casa será
terminada, que a quinta ficará paga, que o dinheiro emprestado será devolvido.
Ao contrário de uma ‘raspadinha’, no Investimento esperamos períodos longos até
vermos os primeiros frutos, os primeiros retornos. Por isso, realidades
económicas e políticas marcadas pela instabilidade são realidades cujos
investimentos tenderão a ficar atrasados, sobretudo aqueles alicerçados em
riscos maiores ou com garantias menores. Perguntar-me-ão: não haverá
investimento em Trás-os-Montes até nova maioria absoluta? Não, haverá. E haverá
se os agentes privados, por um lado, sentirem que a estrutura da Democracia
Portuguesa não gerará oscilações “morais” das taxas de juro e se, por outra
via, os agentes públicos, independentemente da cor, souberem trabalhar para a
região.
Isto leva-nos aos projetos de
transversalidade temporal. As regiões em todo o mundo mais desenvolvidas não o foram
porque tiveram governos de direita ou de esquerda ou porque tiveram deputados
de direita ou de esquerda. Muitos estudos provam que as regiões que mais
beneficiaram do ‘pork barrel’ (isto é, investimento de simpatia pelos
eleitores) foram aquelas que tiveram os políticos e os cidadãos que souberam
impor-se, que souberam trazer investimento, emprego e projetos para a sua
terra. Numa altura em que os partidos se mostram muito difusos, também em
vários momentos da vida política internacional se tem verificado que, nessas
brechas se encontram oportunidades que os políticos mais amigos da sua terra e
dos seus eleitores podem usar para trazer projetos que, noutras circunstâncias,
não viriam a luz da aprovação. Portanto, as regiões mais favorecidas nos
momentos de instabilidade política são as que têm os políticos mais astutos mas
também mais próximos da terra. Ao contrário, se as regiões tiverem deputados de
memória curta, então os momentos de instabilidade política tenderão a reforçar
o centralismo dos parlamentos nacionais e a esvaziar o poder e o interesse
locais.
Finalmente, o planeamento de
transversalidade partidária, subjacente no anterior ponto, recorda que
falta-nos a dimensão da regionalização para servir de estabilizador automático
das crises nacionais. Orçamentos regionalizados evitariam a dependência dos
humores de São Bento (aliás, um homem com humor muito variado segundo a
hagiografia). Quando tivermos uma verdadeira regionalização, ficaremos tão
preocupados com a maioria em São Bento como costumamos estar com as maiorias no
Parlamento Europeu. Mas depois a importância que damos aos homens e mulheres de
São Bento será menor do que aquela que vão tendo. Esperemos que os homens e as
mulheres de São Bento saibam retribuir tanta importância que lhes é dada.
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