sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

De onde somos?



Há cinquenta anos atrás, um transmontano que fosse viver para Lisboa tenderia a responder à pergunta “De onde é?” com a sede de concelho ou, então, depois da confiança conquistada pelo outro, a detalhar a freguesia de onde era natural. Tendemos a responder a esta pergunta tão simples “De onde vens?” de modo a que, não faltando à verdade das nossas origens, não nos interroguem de seguida com uma das perguntas mais mesquinhas que se pode fazer: “E onde fica isso?”. Daí que, gradativamente, se responda Vila Real – Montalegre - Salto ou Vila Real - Santa Marta - Concieiro, para se evitar o atestado de ignorância geográfica do nosso inquiridor. Cinquenta anos depois, nos dias de hoje, com a globalização instalada, o embaraço mantém-se perante muitos. Que o digam os nossos emigrantes que por vezes já nem respondem “Vila Real” mas antes “Porto” ou “Norte” quando lhes perguntam de que parte de Portugal são.

No entanto, a globalização tem acelerado a homogeneização de muitas matérias. Nomeadamente, a aproximação do discurso político entre as diversas forças partidárias europeias, como provo numa investigação que será publicada em 2016 pela Applied Economics, conduzida em co-autoria pela Professora Elina de Simone (da Universidade de Roma Tre). Analisámos os manifestos eleitorais de todas as democracias europeias desde a década de 1970. E verificamos que tem existido uma tendência de diminuição das diferenças de tópicos, de semântica e inclusive de interpretação dos fenómenos sociais e económicos sobre os quais os partidos políticos são chamados a pronunciar-se para cativar o eleitorado.

Se todos os cafés servem igual, de quem é a culpa? Tradicionalmente, do consumidor e do regulador. Também se tem verificado que o famoso Eleitor Mediano tem ganho terreno no contexto europeu, obrigando os partidos a mudarem o seu posicionamento para centróides das suas áreas de reflexão de maior proximidade com os “centros”. Também o regulador europeu (instituições europeias, entenda-se) tem incrementado o apoio informal aos partidos “bem comportados”, penalizando por diversos instrumentos os mais radicais – o que liberta espaço para as ideologias mais extremadas crescerem nas sombras do oficial e não serem debatidas/anuladas nos Parlamentos estabelecidos. Mas, se todos os cafés servem igual, a culpa também é dos taberneiros – isto é, dos políticos que se acusam, assim e inconscientemente, de querem maximizar a coleta de votos e para isso usam discursos melífluos sob o risco de faltarem aos seus fundamentos, e afastando tacitamente as vozes correlegionárias mais dissonantes (quer as mais leais com os fundadores quer as mais afastadas da centróide partidária). Como consequência, vamos tendo partidos com discurso cada vez mais igual, mais previsível, mais manipulável pelos financiadores, lobistas e sombras.

Antes, as diferenças nas mensagens político-partidárias eram bem mais nítidas. Assim como era muito mais difícil que o treinador do Benfica treinasse (de seguida) o Sporting. O ritmo da globalização obrigou a uma aceleração da homogeneização em certos domínios assim como conduziu a um radicalismo exacerbado em esferas que pareciam neutralizadas. Porque, convém não esquecer, um dos princípios do Império Romano (tão bem aproveitado pelas tropas vândalas de Alarico em 410) a concentração ao centro facilita o cerco dos que estão fora.

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