Desde cedo, a imprensa fascinou.
Ainda que assente na efemeridade das notícias ou na contingência das crónicas,
a leitura, debate e por vezes recorte e arquivo de artigos faziam parte do meu ambiente
familiar – sobretudo com o meu Saudoso Pai – em redor de títulos como “A Voz de
Trás-os-Montes”, “O Primeiro de Janeiro”, “O Comércio do Porto”, o JN ou o DN. Outros
amigos saudosos, como o Senhor Macedo (na Pedro de Menezes) ou o Senhor Amândio
Machado (na Santa Sofia) eram autênticos colecionadores de exemplares diários e
leitores apaixonados de todas as linhas. Alguns dos anteriores títulos, como
sabido pelos meus leitores, são títulos extintos mas que cumpriram para o
areópago de ideias, o fomento de ideais, e a reflexão sobre as gentes e o
espaços para muitos de nós.
A possibilidade de uma atenção
maior da minha parte veio com o “Diário de Notícias Jovem”, suplemento semanal
onde leitores/autores partilhavam crónicas e textos no Diário de Notícias sob a
batuta do amigo (Comendador, agora) Manuel Dias. Nesse espaço – onde ‘nasceram
para o público’ outros nomes como o Zé Luís Peixoto, o Pedro Mexia, o Alexandre
Andrade, o José Mário Silva e tantos outros – geravam-se estímulos, críticas,
leituras e desinterpretações que, sem dúvida, amadureceram muitos de nós nos
vários caminhos percorridos posteriormente.
Mas ainda hoje, tendo a imprensa
evoluído do suporte de papel para o digital (desde o ecrã dos computadores até
à palma da mão que espreita o iphone) a imprensa continua o seu papel.
Partilham-se notícias querendo destacar algo que vai para lá do Gosto. Comenta-se
(por vezes com Comentários mais longos que a própria notícia). Atira-se com um emoji
quando outras reações se impõem. No fundo, ao contrário do que parecia
advogar-se há 10 anos, hoje a imprensa é muito mais reativa e palco de partilha
de emoções do que poderíamos todos prever. Os “títulos” desenham inquéritos a
toda a hora, há coleta de dados formalmente (e informalmente, o que tem levado
as várias estâncias comunitárias a uma reflexão que há muito se vinha impondo),
e escolhe-se o ordenamento das ‘notícias’ de modo a captar públicos vários e
atenções várias dependendo da hora do dia, do leitor em causa, das páginas que
ele e ela visitaram anteriormente.
Dentro desta avalanche de
transformações (onde devemos salientar -infelizmente - a ultrapassagem e/ou
despedimento de muitos profissionais excelentes), queria hoje chamar a atenção para
uma fonte de receitas dos grupos que controlam ou que investem a imprensa (e os
media, como é óbvio) – os anúncios publicitários. Desde os anúncios discretos
associados a spots fixos, até a pseudo-reportagem inteligentemente concebida ou
politicamente financiada, passando pelos anúncios que obrigam a engenharia
informática para desobstrução, muitas figuras surgiram agora.
Estudar os anúncios (alguns,
interessantíssimos ex-votos como fiz num artigo publicado em 2012 na Kyklos) é
um trabalho apaixonante. Desde a análise da mensagem – quer a explícita, quer a
implícita – passando pelo custo associado até à forma do mesmo, revela muito da
nossa sociedade, dos nossos conceitos de espaços de comunicação de necessidades
(que é a definição de Mercado) bem como da perceção que os anunciantes tem do
público recetor.
Foi isso que eu e duas colegas
investigadoras polacas (Justyna Dobroszek e Lena Grzesiak) realizámos sobre os
anúncios de jornais do centro da Europa. Focamo-nos sobre um dos setores que
mais tem contribuído para as taxas de crescimento económico tão altas de países
como a Polónia – o setor dos transportadores e da logística. Num mundo tão
sedentário, tornamo-nos rapidamente dependentes de quem faz o transporte por
nós. Os países da Europa Central compreenderam-no e tem recolhido ganhos dessa
aposta. Por isso, anúncios pedindo profissionais para este setor são abundantes
nas páginas dos jornais da Europa Central. O resultado dessa reflexão vai ser
publicado em breve no International
Journal of Logistics Management mostrando como o próprio setor se
modernizou para se encontrar com as exigências diversificadas de transportes de
materiais, produtos e cidadãos.
Porque um dos fascínios do
leitor-amante de jornais, com um café à frente e conversas ao lado, é aprender
a ler nas entrelinhas e saborear a prorrogativa de desfolhar o mundo como se de
um jornal se tratasse.
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