Já há muito que os velhos da
maioria dos contos do Araújo Correia – do João, porque também há o Camilo –
deixaram de existir no Douro e no imaginário do Douro. Aquela população idosa,
apaixonada, obstinada, dramática, vencida mas – sobretudo – estática, já não
existe com tanta frequência no Douro. Nem no nosso país.
Temos hoje uma população sénior,
maioritariamente pensionista, que consome nos grandes centros e nos centros
comerciais, que dinamiza o comércio local, que redistribui (porque tantas vezes
tiram do sufoco o orçamento familiar dos filhos e genros), que apoiam os netos
nos esforços escolares (quer com dádivas de dinheiro quer com sacrifício de
tempo) e que investem! Sim, são eles quem – e regressando a esta terra com o
foco deste texto – são eles quem maioritariamente compõem e pedem para compor
muros rurais, alçam construções nesses campos, e até ajudam – mais uma vez com
o próprio suor ou com o que vem no vale postal – a casa do filho e/ou do genro
emigrante.
Mesmo nas áreas litorais do nosso
país já não são só Cegos do Maio – são homens e mulheres que não ficam à
beira-mar olhando o próprio mar. Praticam desporto, sabem de cór os valores do
colesterol bom e mau, discutem nos cafés – aliás, acho que são eles quem
maioritariamente ainda discute nos nossos cafés assuntos de interesse público –
e penetraram nas redes sociais em força, alguns com ‘posts’ motivacionais,
outros com fotos e terceiros com barómetros políticos.
Assinei com Cilina Vilela – com a
igualmente transmontana Cilina Vilela – o estudo “No country for old men”? The multiplier effects of pensions
in Portuguese municipalities, aceite para publicação no prestigiado Journal of
Pensions Economics and Finance. Este é o primeiro artigo a
simultaneamente avaliar o efeito multiplicador nas pensões na economia local
assim como a influência que vem das oscilações nas pensões dos municípios
vizinhos.
As conclusões remetem para
realidades importantes. Em primeiro lugar, as pensões são relevantes para
dinamizar o poder de compra dos nossos municípios. Portanto, uma Política
Nacional de Pensões não as pode considerar como o parente pobre do Rendimento
Nacional, tanto mais que ao fazê-lo está a desconsiderar uma população
significativa (e crescente por razões socio-demográficas) do nosso país, com as
consequências inerentes de ineficiência económica e de reducionismo ético. Em
segundo lugar, uma consequência importante – o consumo em determinados centros
aumenta com as pensões vizinhas. É a tal história do idoso de Santa Marta que
vem comprar ao Shopping de Vila Real – ou o idoso de Sabrosa que vai de férias
para Monte Gordo. Esta realidade obriga a que os decisores dos espaços
‘sangrados’ (aqueles onde a pensão cai mas que não a conseguem aproveitar)
tenham políticas de incentivo ao consumo local, evitando o
sangramento/”leakage”. Em terceiro lugar, dado o papel redistributivo do idoso
– que, como visto, dá muito aos netos – por vezes vê a parte doada da pensão a
ser mais facilmente gasta pelos netos no Shopping de Vila Real ou em Monte
Gordo. Logo, continuando a querer os idosos ativos no esforço redistributivo –
impõe-se uma questão: como levar os jovens a gastar em Santa Marta, em Sabrosa,
em Murça, em Carrazeda de Ansiaes, Terra dos Bouro, Baião ou até em Canas de
Senhorim? Porque, convenhamos, esta juventude também já não é a mesma que os
Araújos Correia – quer o João quer o Camilo – conheceram.
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