Desde que nascemos, que
percebemos que somos diferentes. Uns dos outros. Dos nossos Pais e Avós. A
vizinhança tem casas diferentes e o mesmo condomínio alberga tapetes diferentes
na porta das frações. As garagens guardam viaturas diferentes – quer na cor,
quer na cilindrada, quer no ano de matrícula.
A literatura sobre a Desigualdade
sócio-económica raramente se preocupa com estas diferenças. Porque a
desigualdade social começa na desigualdade das preferências com que cada um
nasce e se cria. Uns nascem ou aprendem a gostar do vermelho, outros do verde e
terceiros do amarelo. Há também quem nasça ou aprenda a gostar do azul e das
outras cores. Portanto, poderemos considerar que a desigualdade sócio-económica
começa nos genes de cada um. Preferimos amizades diferentes, madeixas
desiguais, frequência de cafés distintos, compositores diversos, bandas
filarmónicas divergentes das preferidas dos nossos mais próximos. Depressa
percebemos que somos diferentes no tamanho, na altura, no peso, na beleza e na
atratividade, na capacidade de abstração e nas qualidades estéticas. Uns gostam
delas grandes, outros gostam delas pequenas e há até quem as prefira bem
passadas – às postas maronesas, claro!
Mas a literatura sobre a
Desigualdade sócio-económica considera que esta é muito mal percebida pelos
indivíduos na observação de três cenários.
O primeiro cenário é relativo à
desigualdade que impede a obtenção de mínimos absolutos de sobrevivência física
e social. A desigualdade que mata uns à fome, que reduz o ser humano a um
animal ou que impede a satisfação básica dos indivíduos com a sua vida é o
primeiro cenário que despoleta a revolta.
O segundo cenário deve-se à
desigualdade de recompensa pelo mesmo esforço. Fica revoltado o aluno que
demonstrou o mesmo empenho que o colega e que tem nota mais baixa; fica
revoltado o funcionário público que com o mesmo (ou melhor) desempenho que o
seu colega e é preterido por critérios oficiosos; fica revoltada a região que
paga os mesmos impostos e vê uma côdea de recompensa do Orçamento de Estado,
repetida a côdea ano após ano na legislatura.
O terceiro cenário é o que impede
o desenvolvimento do indivíduo e do grupo por condições exógenas como a cor da
pele, o sotaque da sua voz, a pobreza do berço ou a distância para com as
capitais. É próprio do ser humano ultrapassar-se; é imoral limitá-lo.
Refleti com colegas brasileiros
(do Paraná) sobre estas desigualdades nas remunerações da Indústria brasileira.
Esse reflexão foi publicada no
jornal científico Quality and Quantity sob o título “The luck of being of the
right gender and color: a detailed discussion about the wage gaps in the
Brazilian manufacturing industry”. Lá (como cá) esforços iguais tem
remunerações diferentes – que pouco tem a haver com a produtividade de cada um.
Ter a cor de pele certa e ser do género certo é premiado no Brasil mais do que
ser um bom operário.
Será que cá olhamos também a
outros fatores como o cartão partidário, a importância da jurisdição onde se
vota, a centralidade em determinadas redes sociais, os cafés que se frequenta,
os Gostos que pomos nos posts boçais de algumas individualidades ou nas fotos
estranhas dos seus Instagrams? Ou será que, bem no fundo, aceitamos a Desigualdade
e somos sempre dos Três Grandes, do Arco do Poder e quando podemos parecer
maior tentamos fazer os outros (parecerem) mais pequenos? No fundo, bem no
fundo, Marco Antonius não era tão diferente de Brutus.
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